quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

A crônica sem nome


Pode não fazer sentido. Ou pode também. E eu ainda não tenho um nome para isto. Nada traduz aquele cotidiano tão distante.
Toda manhã, bem cedo, o cheiro do café quente inundava a casa. A mesa posta com a toalha vinho, cheia de frutas amarelas, pintadas à mão. As coisas prediletas sempre ao alcance das mãos e da minha vontade. O relógio pendia na parede. Os ponteiros a correrem, sempre, sem trégua alguma. Sempre a marcar a hora que eu esperava com tanta agonia. E às vezes com certa comodidade. Ou talvez, eu diria, que anestesiada. O banho rápido. A água morna caindo nas costas. Parecia lavar a alma. A melhor sensação do dia inteiro era essa. Uma sensação de liberdade, ou algo parecido. A roupa na cama, já arrumada, que eu vestia, tinha um perfume inconfundível de limpeza. E quase sempre eu vestia às pressas. E o relógio continua na sua rota, num ritmo desesperado, como quem está a lembrar que o certo é correr o quanto as pernas aguentarem.
A maquiagem simples, apenas a esconder algum vestígio do sono e destacar os cílios, que por si só já se destacavam um pouco.
Quando o rito diário e caseiro cessava, era hora de ir. A longa viagem estava só começando. O sol era observado pela janela do ônibus. Ainda tímido, começando a se despir do vermelho do horizonte.
As mesmas ruas, postes, árvores. E quase sempre as mesmas pessoas, e quase que exatamente nos mesmos lugares, a dar os mesmos passos.

Cada parada, uma pessoa diferente subia. Um cotidiano diferente. Um ser cheio de ritos diferentes. Cada qual ao seu modo. Uns iam rezando, outros cantando, outros apenas ouvindo uma música qualquer, alguns lendo e alguns apenas em silêncio, provavelmente pensando no dia que teria, ou na noite que passara, bem ou mal.
Alguns cachorros na rua. Ou gatos.
Muitas vezes eram visíveis pessoas que dormiam na rua. Normalmente isso partia o coração. Mas quando eram manhãs de inverno, ensolaradas ou não, a sensação era pior. Uma sensação de impotência diante de algo tão estranha e estupidamente comum.
Quando, de longe já se via nosso destino, todos se preparavam para o longo dia que com certeza viria.
Entrar pelo grande portão. Subir a pequena escada. Bater ponto. Depois subir de novo. Até que se chegou ao fim da caminhada.
O "bom dia" surtia bons efeitos sobre o humor de todos. E então o início do trabalho.
Dia vai, dia vem. O bom e velho relógio a marcar as obrigações. E ele não anda pra trás. Nunca. Então é melhor que tudo fosse feito como era esperado.
As nove horas diárias eram, geralmente, calmas. Mas, em algumas exceções, elas sufocavam. Ou talvez o que sufocasse, era a sensação de prisioneira que me invadia. Ao sair por uma tarde na rua, ao ver pelo menos o asfalto e sentir o cheiro do dia, uma sensação de liberdade me voltava à mente e ao corpo.
As pessoas que passaram por todos esses dias, e por esses dois anos a fio, jamais serão esquecidas. É impossível se desgrudar de uma lembrança tão forte e que fez aprender tantas coisas importantes. Cada um à sua maneira, tem o seu pedacinho da minha memória. Tem a sua célula do meu corpo.
No final do dia, o mesmo trajeto, mas ao contrário. E o engraçado é que geralmente, as pessoas da ida, também faziam parte do trajeto de volta.
As coisas que mais ficam guardadas na memória são as tardes quentes verão. O sol extremamente quente e cruel pintando de amarelo ofuscante o céu bem azul. Em algumas dessas tardes do passado, as tempestades se faziam presentes. O céu aparentava ter um peso incalculável. De azul, já havia passado para cinza escuro e gradativamente para um negro amedrontador. Muitas vezes não havia tempo nem mesmo para se esconder. Mas ali, a sensação de liberdade nascia novamente. A prisão acabara.
E em certo momento, num certo dia em que acordei diferente, as coisas já não eram mais as mesmas. Eu não era mais a mesma. E precisava alterar tudo que pudesse ser alcançado, e com urgência. A rotina imutável respirava do meu próprio ar, que era escasso. Foi difícil a decisão. Mas aquilo que deve ser feito, aquilo que já está decidido, não muda. E assim tudo teve um fim. A rotina foi aniquilada. A prisão foi anulada. A força sobre-humana que eu extraía de mim mesma para resistir, não precisava mais ser gasta.
Foi uma tarde triste. E de alívio. Saudade. E talvez um desvio de rota. Mas isso pouco importa.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

Mário


Mário tem um problema,
ele não é feliz.

Mário é uma alma perdida
no vasto mundo.

Mário tem um coração de pedra,
que não sabe demonstrar amor.

Mário já não vive mais,
seu coração de pedra quebrou em pedaços.

Mário se perdeu,
e foi em algum momento de sua existência.

Mário se perdeu em meio à grande dor,
ele não vê mais a beleza da vida.

Mário morreu de tristeza,
talvez no dia em que nasceu.

domingo, 15 de setembro de 2013

Breve adeus



Dizem que as tragédias nos inspiram a escrever sobre as emoções. E hoje isso é verdadeiro para mim. Hoje mais uma alma se perdeu pelo tempo. Ontem, era vida a transbordar. Hoje é vida que vive somente em nossas lembranças. Cada um que esteve presente lá hoje carregava tantas emoções e pensamentos, que era possível sentir esse peso.

As lágrimas eram a única expressão possível. Hoje todos nós perdemos um amigo. Hoje pais perderam seu filho. O hoje ficará marcado na história para sempre. Os nossos olhos nunca esquecerão daquela imagem. Mas faremos o possível para que apenas as chamas das boas lembranças permaneçam acesas.

Agora, esperamos que você esteja viajando para seu destino, em paz. Que a eternidade lhe seja o descanso merecido. Olhe por nós, pois nunca nos esqueceremos da marca que você deixou na Terra. E que o nosso adeus seja breve, então.

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Naufrágio


Existe algo em navios naufragados que me deixa curiosa. Ou interessada. Acho incrível a imagem que fica quando olhamos aquele monstro debaixo do peso do mar. Este, que é uma coisa tão grandiosa, cheia de vida, e esmaga, com sua fúria, qualquer um que afundar demais.

Às vezes me pego pensando em tudo que está sepultado lá embaixo. Quantos corpos, quantas histórias, quantos terrores e amores. E quantos "titanics" já não caíram nas garras do tão temido mar?

Ao observar, da beira da praia, o mar parece tão calmo, tão atrativo. O mar acalma nossos medos, nossos desesperos. Mas e no meio dessa imensidão? É bem engraçado como o mar tem tantos poderes.

E sempre cheio de tantas lendas e monstros desde os tempos mais remotos, o mar sempre será um mistério para mim.

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Tempo




O que é o tempo? É aquela coisa, sim coisa. É aquela coisa que determina e modifica tudo. É engraçado esse conceito de tempo. Porque a gente não consegue tocar o tempo. Mas o ele pode nos pegar no colo, nos virar de cabeça pra baixo e começar uma tempestade em nossas vidas, sem nos perguntar se era isso que queríamos. 
É engraçado também que tudo vira tempo. As pessoas, as coisas, os objetos, as lembranças. Talvez a eternidade seja a casa de todas as coisas que viraram tempo. E com certeza aquilo de que você sente mais saudade está em algum cômodo dessa casa cheia. 

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Coisas

[...]
Porque certas coisas deveriam ser eternas...

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Noturna




O que é a noite? Se o dia é um véu iluminado com algumas sombras dançantes, a noite é uma única sombra, que paira sobre tudo. Um manto negro e pesado que cobre as cidades, esconde sob si os mais misteriosos acontecimentos. A hora preferida da morte e dos assassinos. A hora dos animais perigosos saírem de suas tocas e atacarem suas presas indefesas. É a hora das estrelas, da Lua. É também a melhor hora para os amantes. Em especial, para aqueles que se encontram em segredo. É o momento do sono profundo, do ensaio para a morte.
É dentro da noite que poetas se inspiram e têm seus devaneios. É na noite que os apaixonados não correspondidos choram suas mágoas, bebendo num bar, ou deitados em seus travesseiros.
Durante a noite, deitados em nossas camas, ouvimos os mais diversos sons. E só é possível ouvi-los porque o silêncio passeia pelas ruas e casas.
O que a noite nos reserva, afinal? Sentimentos atingindo seu ápice, explosões de loucura. Um turbilhão de  sensações. Paixões loucas, frenéticas. Uma mistura de corpos se entrelaçando. Uma confusão de imagens, sons e silêncio.
A noite é isso que tem uma vida própria, que exerce um domínio sobre todos. A noite é um mundo, com outros mundos dentro de si. A noite é a mãe do mistério.



sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Horror


A dança macabra do terror,
alucina seus espectadores,
não menos do que os próprios dançarinos.

Nos olhos o horror...
Um tremor sobrenatural.
No corpo, 
sinais de ter sido tomado por algo cruel.

Gritos incessantes, cheios de desespero.
Criatura maldita que se esconde dentro d'alma,
do fogo eterno jamais deveria ter saído.

Todos te maldizemos,
desejando que volte para o lugar de onde veio:
as profundezas do triste inferno.